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Jogo da vez: Shenmue III (PC)

Um jogo feito para os fãs da série, mas que pertence a uma época diferente
                                                                                   
Plataforma: PC
Metascore: 67 (User Score: 6.5) - Até o dia da postagem
- Análise: Michael


Quem me conhece sabe que sou um grande fã da Sega e, como todo "segamaníaco" que se preze, também adoro a franquia Shenmue. Como já expliquei no meu post final da "Saga de um segamaníaco", a série Shenmue começou no videogame Dreamcast no já longínquo ano 2000 (século passado!) junto com o declínio da Sega e foi a última grande aposta da gigante japonesa antes de jogar a toalha no mercado de consoles. Com o "guru" Yu Suzuki na direção e um orçamento estrondoso para a época (cerca de 50 milhões de dólares), o jogo praticamente criou o gênero de "mundo aberto" e trouxe inovações que são padrão até hoje, além de gráficos surpreendentes para a época. Porém, como todo pioneiro, ele também cometeu alguns erros e seu ritmo lento e limitações de combate, aliados ao declínio do Dreamcast, fizeram com que ele fosse um fracasso de vendas, principalmente fora do Japão. Uma sequência com várias melhorias foi lançada em 2001, mas já era tarde demais e ela sequer foi vendida nos Estados Unidos, apenas na Europa e Japão. Com uma série de capítulos restando para finalizar a história, os fãs ficaram órfãos e sem saber se um dia poderiam ver o desfecho da saga.

Foi então que na E3 de 2015, durante a conferência da Sony, para a surpresa de todos, foi anunciada a campanha para fazer Shenmue 3 pelo Kickstarter. Com uma arrecadação recorde, o sonho virou realidade e o terceiro jogo da saga finalmente veria a luz do dia. Todos os fãs aguardaram ansiosamente durante anos e inclusive com um adiamento grande e poucos trailers, mas finalmente o jogo foi lançado no final de 2019, já causando algumas polêmicas como a exclusividade na Epic Store por um ano para o PC. Polêmicas à parte, depois de terminar o jogo em mais de 50 horas de campanha (e várias pausas para curtir o mundo, claro), finalmente é a hora de dar meu veredito. Em resumo, este jogo foi feito para os fãs da saga e, ainda que tenha recebido atualizações tecnológicas, pertence a uma geração anterior de games e dificilmente irá agradar alguém que não jogou e gostou dos dois primeiros.

A história começa exatamente de onde parou (com direito a vídeo de retrospectiva mostrando os fatos dos dois jogos anteriores) e Ryo Hazuki está na China em busca de respostas sobre o mistério dos "espelhos" e atrás de vingança contra Lan Di, o assassino de seu pai. Ele então chega ao vilarejo de Bailu onde encontra a jovem Shenhua (cuja imagem era constante desde os primeiros jogos) e precisa se juntar a ela para desvendar o mistério. Alguns personagens do passado fazem aparições, inclusive com uma ideia bem interessante que permite que o jogador telefone para eles e faça algumas conversas que, apesar de limitadas, são excelentes formas de conectar com o legado da saga. Infelizmente, o jogo não conclui a história e mais uma vez ficamos com a promessa de novas aventuras interessantes. Ao meu ver, esse foi o maior erro de Yu Suzuki: achar que terá a chance de continuar fazendo estes jogos. Após mais de uma década de clamor de fãs, finalmente a Sony decidiu dar uma força para realizar este sonho e, apesar de ter arrecadado bem no Kickstarter, claramente Yu Suzuki teve muita ajuda financeira e de vários parceiros para conseguir concluir o jogo. Porém, como já esperado, o jogo não foi sucesso comercial e provavelmente trará prejuízos. Agora ele se encontra na mesma situação de antes: esperando uma tempestade perfeita de apoiadores e fãs para ser concluído, se é que um dia será. A decisão certa teria sido reduzir o escopo, resumir a história e finalizar a saga de uma vez por todas.

Em termos de jogabilidade, as ideias centrais da série continuam as mesmas e o jogador habita um simulador de vida real com direito a trabalhar para conseguir dinheiro e inclusive com a nova necessidade de se alimentar para recuperar energia. A possibilidade de explorar praticamente tudo que sempre foi uma marca da série, inclusive podendo abrir gavetas e segurar objetos, foi mantida. Da mesma forma, o estilo de jogo que demanda investigação através de conversas e visitas a locais específicos, também permanece. Isso consome bem mais da metade do tempo de jogo e é um dos pontos onde o jogo não evoluiu com os tempos. Somente os mais velhos e fãs terão paciência suficiente para realizar todas as investigações e tarefas da história. Os combates também tiveram uma evolução e agora ficou mais fácil enfrentar vários inimigos ao mesmo tempo, com a necessidade de treinar (bastante!) e adquirir novas skills para evoluir. Finalmente temos uma visão mais apurada da ideia inicial de Suzuki de fazer um "Virtua Fighter RPG" (que inclusive chegou a ser o título temporariamente, vide a semelhança entre Ryo e Akira), mas mesmo assim ainda ficaram arestas a aparar e o combate está longe de ser emocionante ou estratégico como na série Souls.

Sem dúvidas as maiores evoluções da série vieram em termos técnicos. Ainda que as opções de configuração sejam ridiculamente limitadas no PC, os gráficos foram atualizados e estão belíssimos na Unreal Engine, principalmente os cenários e efeitos de iluminação e de passagem do tempo. Em termos do design de personagens e suas expressões é que o jogo pecou e, ainda que Ryo e Shenhua tenham evoluído desde o primeiro trailer, alguns personagens ficaram bizarros e caricatos, com uma falta de qualidade nas expressões faciais. Porém, vale lembrar que estamos diante de um jogo independente e, ainda que Suzuki certamente tenha recebido apoio além do dinheiro de Kickstarter, o orçamento e equipe está longe de se comparar aos grandes títulos AAA do gênero de mundo aberto.

Como um fã da série que estava sedento por mais e inclusive contribui na campanha do Kickstarter, devo confessar que meu coração está dividido. Apesar de gostar de Shenmue III e ter ficado feliz com os momentos de nostalgia e diversão que ele me trouxe, também fiquei triste ao saber que a história não foi concluída. Em um mundo dominado por gigantes como GTA e afins, Shenmue III é como uma TV de tubo super enfeitada e bonita com algumas inovações sendo oferecida no mercado atual. Somente os fãs que estão dispostos a olhar além das suas limitações e com paciência para desfrutar seu estilo estarão dispostos a investir tempo e dinheiro. Dificilmente veremos um Shenmue IV pois, afinal de contas, vivemos em um mundo capitalista onde o lucro é essencial. Porém, confesso que nunca imaginei que um dia estaria fazendo a crítica de Shenmue III e espero de todo o coração que esteja errado novamente.

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