Viajando na maionese: E agora, quem poderá nos defender?
"Pode isso, Arnaldo?" |
Certo dia um amigo de trabalho me perguntou: "Nós brasileiros somos bons em quê?". Apesar da resposta "futebol" ser a escolha mais óbvia, resolvi adotar o pessimismo e responder: "Nós brasileiros somos bons em burlar as regras". Eu diria que, neste quesito, somos mais do que "pentacampeões". Alguns podem argumentar e dizer que na verdade o povo brasileiro é criativo e sabe sair de situações difíceis. O problema, na minha opinião, é que essa criatividade é empregada, na maioria das vezes, para saciar o desejo que impregna o âmago do nosso DNA de povo colonizado por bandidos: levar vantagem. Nós brasileiros somos um povo que sonha com enriquecimento rápido e, de preferência, desacompanhado de qualquer esforço ou mérito válido. E para confirmar isso não é preciso uma câmera escondida ou assistir ao noticiário, basta prestar atenção às coisas simples do nosso dia-a-dia: desrespeito ao próximo e a seus direitos em coisas banais como uma fila ou uma vaga preferencial. Em escala maior, esse desapego a regras gera a desorganização e falta de planejamento que agora está escancarada para todo o mundo diante da nossa incapacidade de organizar um evento como a Copa do Mundo.
Aqui no Brasil nós temos até um nicho profissional que recruta, alimenta e precisa dessa nossa "qualidade": a política. Uma corja de bandidos que se reveza no poder mostrando que o conceito de "direita" e "oposição" é apenas para "inglês ver" aqui na terra do carnaval: muda o governo e tudo continua igual. Até mesmo os corruptos já condenados conseguem permanecer mamando nas tetas estatais ao serem reeleitos por uma população com memória fraca e pensamento afetado pelo desejo de acreditar em promessas mágicas de enriquecimento e melhoria instantânea das condições sociais. Nós temos os políticos que merecemos e elegemos.
A escalada da violência e do desrespeito ao próximo são uma consequência óbvia do descaso político e da injustiça e desigualdade sociais. O aumento dos protestos violentos e agora mais recentemente a atuação de grupos justiceiros é algo preocupante. O mesmo colega da pergunta mencionada acima conseguiu resumir bem os perigos deste cenário atual. Segue uma transcrição de sua fala: "Estamos vivendo um época complicada, uma ruptura. A classe média-alta está cansada da omissão do poder público. Ela está começando a fazer justiça pelas próprias mãos e isto sempre tem um certo exagero. Em épocas assim que regimes totalitários ganham força e "legitimidade" popular. Em épocas assim que o facismo e o nazismo se estabeleceram: eram vistos como salvação para a desordem e o caos.Uma socióloga deu entrevista falando que fazer justiça pelas próprias mãos não é bom, mas esquecem de colocar a lacuna que o estado brasileiro está deixando... a falta de ação do estado que faz com que estas coisas ocorram. Acho que nunca tivemos um distanciamento tão grande entre o Brasil dos políticos e o Brasil do povo. Os políticos estão a anos-luz de distância da população e não estão mais preocupados com nada. Parece que eles tem a sensação de que podem fazer tudo, se omitir dos deveres e roubar à vontade, impunemente. Só que isto vai gerando estes sentimentos na população e daqui a pouco aparece um doido extremista, mas numa aparência mais vendável, e vai ganhando fama. Quando ver, se elege e, em nome da ordem, começam as atrocidades."
E a solução para isso tudo? Virar Batman e sair espancando bandidos? Eu não sei a resposta ao primeiro questionamento e muito menos tenho dinheiro suficiente para cogitar a opção proposta no segundo. Sou um brasileiro preocupado e que se inclui em todas as críticas que realizei, principalmente na questão da apatia. A minha fé me ajuda a ter esperança em um futuro melhor, mesmo discordando da crença de que "Deus é brasileiro", mas temo pelo desenrolar desta situação. Acho que a Copa do Mundo aqui, se seguir a mesma tendência do que vimos durante a Copa das Confederações, tem tudo para elevar a pressão dessa panela chamada Brasil. Só espero que consigamos evoluir juntos e aprender a encontrar a melhor saída sem precisar apelar para a violência ou para o autoritarismo.
Acrescentando ao (excelente) texto algo que já aconteceu, mas que não repercutiu tanto pois não chegava a afetar diretamente a classe média, média-alta ou alta, nem, em um outro prisma, aos meios de comunicação ou intelectuais. No primeiro momento no qual as milícias entraram nas favelas cariocas e expulsaram os traficantes, houve um sentimento de alívio e apoio. Era a salvação contra a opressão do narcotráfico. Após este momento, as milícias passaram a cobrar seus "impostos" em nome de serviços que prestavam: segurança, gás, transporte, tv a cabo... Sendo seu o monopólio dos "serviços", a fiscalização dos mesmos e a arrecadação dos "tributos". Segurança, por exemplo, é obrigatório pagar, queira ou não. Ou seja, seu poder se tornou enorme. E então, o antigo oprimido pelo tráfico passou a ser oprimido pela milícia.
ResponderExcluirComentário muito pertinente! Obrigado pela contribuição!
ExcluirAtualização, três meses depois: http://oglobo.globo.com/opiniao/na-idade-das-pedras-12517269
ExcluirPois é, a copa tá chegando e ao que parece a coisa vai ficar feia!
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