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Jogo da vez: The Last Guardian (Playstation 4)

Mais uma obra de arte digital que eleva os videogames e mostra seu poder de criar experiências únicas
                                                                                                                                                         
                                                                                   
- Plataforma: Playstation 4
Metascore: 8.2 (User Score: 8.2) - Até o dia da postagem


O jogo anterior do designer Fumito Ueda, Shadow of the Colossus, foi um dos grandes sucessos do fim da era do Playstation 2 e está no topo da minha lista como o melhor jogo de todos os tempos. Inclusive eu já fiz uma análise detalhada, basta clicar aqui para ler. O fato é que, depois desse jogo, lançado em 2005, o próximo projeto de Ueda, batizado apenas de Trico na época, teve um desenrolar extremamente caótico e se transformou em uma espécie de unicórnio dos games. Após aparecer em fotos e inclusive videos em algumas edições da E3, ele simplesmente sumiu, coincidindo inclusive com a saída de Ueda da Sony (apesar de declarações de que o desenvolvimento do jogo continuaria). A geração do Playstation 3 passou sem previsão de lançamento e foi apenas na E3 de 2015 que o jogo ressurgiu das cinzas anunciado agora para Playstation 4. Somente no final de 2016 é que o jogo foi finalmente lançado e, talvez devido a uma expectativa surreal, teve recepção morna de crítica e público. Como fã incondicional de Ueda, este jogo sempre esteve no meu radar e, depois de finalmente saboreá-lo com a tranquilidade e tempo necessários, estou aqui para tentar defender o que considero um dos jogos mais ousados e cativantes dos últimos anos.

Se os games são considerados uma forma de arte por muitos, os jogos de Ueda merecem estar no "Louvre" desta era digital, tanto por sua beleza quanto por sua inovação. Com uma paleta visual característica em todos os três jogos lançados pela Sony (Ico, Shadow of Colossus e The Last Guardian), ele possui um estilo único de gerar imersão através da jogabilidade e com poucas intervenções ou auxílios visuais. Você não vai ver quase nenhum mostrador, não há barra de vida e nem textos que irão te mostrar o que fazer. O transcorrer do jogo é o que mostra o que deve ser feito e como deve ser feito. Claro que, talvez devido a insistência de seus chefes, existem alguns elementos que irão ajudar aqueles que empacarem, mas Ueda acredita na imersão total e confia na inteligência de seus jogadores. Porém, em uma época onde os jogadores estão "mimados" com tutoriais e escolha de dificuldade, muitos irão estranhar essa abordagem e não tratarão seus jogos da forma necessária: uma experiência de aprendizado e uma jornada com seus personagens.

Nestes quesitos citados, The Last Guardian talvez seja um dos jogos que mais demandem paciência do jogador. Ele nos coloca na pele de um menino que acorda preso ao lado de um "monstro" gigante e aos poucos vai desenvolvendo um relacionamento de dependência mútua com o animal (uma mistura de ave e gato gigante batizado de Trico por Ueda). Com pouquíssimas intervenções de história ou de ajuda, vamos descobrindo aos poucos como tudo aconteceu e o que precisamos fazer para progredir. O jogador precisa resolver puzzles, escalar e, principalmente, interagir com Trico para superar os mais variados obstáculos. Um momento onde essa dependência fica clara é no combate: você não consegue se defender e precisa da força de Trico para derrotar as "armaduras fantasmas" que tentam te aprisionar. No entanto, a interação com Trico foi pensada para retratar um relacionamento real com um animal, ou seja, você precisa cuidar de suas feridas, dar comida e acariciá-lo para ir estreitando os laços. E, como em todo relacionamento com um animal, ele algumas vezes tem vontade própria e não vai obedecer seus comandos de primeira ou empacar esperando comida. Dependendo do quão bem você tratá-lo, sua obediência irá melhorando até o ponto em que ele irá protegê-lo como um leão e ficará "adestrado" para seguir seus comandos quase instantaneamente. Esta escolha inovadora de design é muito corajosa e interessante, mas também é polêmica, pois fará com que muitos jogadores mais impacientes se irritem com o jogo.

Falando em termos de inovação, desde os primeiros instantes com o jogo ficou claro que o hardware do Playstation 4 era realmente necessário para dar vida a este mundo e seus personagens. Trico ocupa um grande espaço na tela e suas reações corporais são impressionantes, seja através de movimentos meticulosamente programados ou sons que demonstram suas emoções. Seu corpo é coberto por penas que reagem aos seus movimentos e ao ambiente, seja com vento ou água. A física é impressionante e traz colisões realistas e uma movimentação da criatura que nos faz acreditar no seu tamanho. Para completar, temos um cenário grandioso e elementos como vegetação, folhas, animais, etc. Só de pensar na programação necessária para tudo isso e para a inteligência artificial de Trico eu já começo a entender as complexidades técnicas envolvidas neste projeto e os motivos de seus contínuos adiamentos.

Porém, também é preciso destacar que esse processo de desenvolvimento complicado deixou sequelas no jogo. Tendo em vista toda a dificuldade técnica de implementação da visão de Ueda, é até compreensível o fato do jogo ter uma duração curta se comparado a Shadow of the Colossus ou Ico. Fica claro que em alguns momentos temos "barrigas" e alguns puzzles desnecessários que estão ali apenas para estender o tempo da jogatina e não permitir com que o jogador termine em poucas horas. Também tempos algumas quedas consideráveis de frame rate no PS4 normal (que parecem não acontecer no PRO) e problemas com a câmera e controles que irritariam até mesmo o Dalai Lama. No entanto, pelo menos ao meu ver, tudo isso é um  preço pequeno a ser pago em troca da oportunidade de vivenciar este jogo e no final das contas não mancha a imagem que guardo dele.

Seria um grande erro terminar minhas ponderações sem sequer mencionar a trilha sonora do jogo. Como já era de se esperar de Ueda e sua equipe devido ao que experimentamos nos jogos passados, a música orquestrada é magnífica e se mescla perfeitamente com o ambiente e com a jogabilidade, tanto nos momentos mais emotivos quanto nas partes mais agitadas da aventura. Ela cumpre a sua função de completar a imersão no universo do jogo.

Só o futuro dirá se veremos a criatividade artística de Fumito Ueda novamente em jogos deste nível. Agora que ele fechou sua trilogia para a Sony, parece que irá focar em jogos menores e alternativos. Falo trilogia pois vejo uma conexão clara entre seus jogos fazendo com que os jogadores tenham experiências distintas: Em Ico você deveria proteger uma garota e ajudá-la a escapar de criaturas; Em Shadow of the Colossus você precisa combater criaturas; Em The Last Guardian você depende da ajuda de uma criatura para poder se defender e escapar.

Certamente foi uma jornada fantástica e guardarei com muito carinho mais esta obra-prima de Ueda em minha coleção. Espero que ele continue a me surpreender com seu talento único e que receba todo o reconhecimento que lhe é merecido. A quem tenha tido a paciência necessária para ler esta longa análise, espero ter aumentado seu interesse em experimentar este jogo único.

E, para fechar, deixo um vídeo bem interessante que mostra muitos dos itens citados por mim neste texto e faz uma análise da linguagem no design de videogames:



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